International Falls é uma cidadezinha norte-americana que fica à beira de um imenso rio, o qual marca a divisão entre aquele país e o Canadá. Isso significa que ali o movimento é mínimo, e os moradores se conhecem pelos nomes e pelas gerações. Isso também significa que uma alma viva que tenha vontade de “ir além” ou do “algo mais” sente-se automaticamente prisioneira daquilo tudo. Além disso, International Falls é o nome original deste longa, que no Brasil foi intitulado como “O Lado Engraçado da Vida”.

Ali, Dee (Rachael Harris) é uma mulher de seus quarenta e poucos anos que trabalha no que é provavelmente o único hotel da cidade. Com a vida amorosa de casada completamente fria, enquanto cria as duas filhas e assiste às traições de seu marido, o negligente Gary (Matthew Glave), Dee passou a enxergar sua vida como uma espécie de ciclo carcerário sem fim. Como seu emprego lhe garante observar o único movimento fora do comum da cidade, que é o raro fluxo turístico que se hospeda no local, logo ela fica sabendo que um promissor comediante passaria por ali.

Tim (Rob Huebel) é o comediante. Porém, apesar de claramente contar com humor satírico e ácido acima do normal, ele mesmo se intitula como uma fraude, e faz questão de deixar claro que isso não é piada. Não que ele não seja engraçado, mas seu casamento fracassado e a distância do filho o fizeram perder quaisquer perspectivas sobre sua vida, algo que o intimida por não saber mais o que fazer além de shows de stand-up. Com isso, o encontro entre ele e Dee é inevitável, e logo um laço se cria.

O mais interessante deste longa é que o roteiro de Thomas Ward não constrói a atmosfera com pressa, e dá tempo aos dois personagens centrais. Isso faz com que o espectador entre no ritmo de International Falls, e isso também faz com que quem assiste ao filme crie uma série de julgamentos sobre Dee e Tim, sobretudo quando a relação dos dois começa com a sexualidade incômoda que eles insistem em usufruir. Com ambos, não há um encontro sexual, apesar de haver sexo, e sim o de duas almas encarceradas dentro de suas próprias existências, precisando uma da outra naquele momento de suas vidas.

Desta forma, Ward é hábil ao contornar o aparente marasmo com dois personagens cativantes e simples, que não precisam de muito para criar identificação, o que é ótimo do ponto de vista estrutural do roteiro. Pois, caso contrário, o espectador poderia facilmente sentir-se destoante daquela realidade, e isso não acontece. Assim, a direção de Amber McGinnis dá espaço para o brilho dos atores, e pouco a pouco Rachael Harris e Rob Huebel ganham o tempo de tela que precisam para cativar.

Enquanto isso, o relacionamento de Rachael com seu marido ganha seu próprio arco, o desenvolvimento da personagem, claramente a protagonista, é eficiente e, ao final do segundo ato, quando o desfecho começa e Dee precisa tomar determinadas atitudes, a atriz é sensível e brilhante em deixar sua composição ligeiramente menos contida, algo que fica evidente quando ela pega o microfone e fala. Desta forma, o filme carrega seus personagens em constante estado morno, como se aqueles dois adultos centrais não pudessem mais encontrar quaisquer outros aspectos positivos em suas vidas.

A grande questão é que International Falls é a divisora não só de territórios, mas de duas vidas que precisavam encontrar seus respectivos fins, e como isso é apresentado chega a surpreender porque o espectador, envolvido no banho-maria, não esperava por quaisquer alterações de ritmo do roteiro, e elas acontecem. E mais: Rachael Harris merece aplausos por conseguir contornar o pequena plot twist com o que de fato alguém como Dee faria. E a liberdade de seu olhar é o que comove e ganha o espectador de vez, neste pequeno filme que começa tímido, mas que veio para ficar.

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