Quando duas amigas decidem viajar para esquecer do maior de seus problemas no momento, o sexo masculino, eis o tipo de situação que qualquer filme parece evocar: o perigo iminente às personagens femininas na mão de um homem. Ainda que uma repaginação do conceito pudesse trazer novidades interessantes a esse clichê dos anos 1990, não é isso o que acontece neste “Águas Negras”, e o resultado é desastroso do ponto de vista narrativo e técnico.

Após sofrer o grande trauma da perda do irmão por um incidente no qual esteve indiretamente envolvida, Tara (Catherine Lidstone) carrega o peso do remorso mesmo após anos do ocorrido. Como também nutriu um relacionamento tóxico por tempo demais, sua melhor (e abastada) amiga, Amy (Angela Gulner), a convida para passar um tempo na casa de férias da família, à beira de um lago e, portanto, isolada demais caso algo aconteça. Obviamente algo acontece, mas é através da sedutora presença de um estranho, Lucas (Peter Porte). Aos poucos, ele começa a participar da vida das garotas, inclusive sexualmente, e esse “macho fatal” mostra-se cada vez mais perigoso.

É claro que Amy jamais reconhece essa possibilidade, e que Tara soe cada vez mais neurótica em relação ao fim de semana que decidiu passar com sua amiga para descansar. Porém, além da obviedade do roteiro de Nanea Myiata, que também assume a direção, é o problema com a estrutura do longa, que jamais apresenta o arco da protagonista como algo a ser comprado pelo espectador. Ou seja, Tara soa sempre irritante, desconfiada e irrepreensível do ponto moral, algo que claramente cria o contraponto à manipuladora Amy e, no final das contas, faz com que quem as assiste pouco se importe com o final de suas vidas.

Com isso, existe uma forte estrutura que foi popularizada nos anos 1990, com filmes como “Pânico” e “Eu Sei o Que Vocês Fizeram no Verão Passado”, por exemplo, e que naquela época eram forçadamente jogados pela garganta do público. O grande problema, então, é que este longa manteve a estrutura, e incluiu um homem sedutor para mexer com o caráter de duas mulheres. Como se isso já não soasse problemático o suficiente, existe uma reviravolta no terceiro ato que pode fazer o espectador jogar a toalha.

Além disso, o filme sequer aproveita o cenário maravilhoso de suas locações, pois a fotografia está sempre escura, talvez como uma solução encontrada para antever problemas orçamentários. Porém, caso tenha sido este o caso, por que escolher um local aberto para filmar? E mais: a fotografia parece corroborar com o roteiro ao jamais deixar o perigo junto a Tara e Amy algo real, soando mais como a iluminação encontrada em uma fantasia sexual do mais carente dos homens.

Desta forma, “Águas Negras” não aproveita sequer a premissa que motiva Tara a ser temerosa com tudo ao seu redor, e isso fica evidente na atuação de Catherine Lidstone, que não parece encontrar o tom certo para não forçar a existência de sua protagonista. Porém, é bem provável que isso seja parte dos problemas estruturais, e o roteiro não ajudou a atriz nem um pouco. Assim, se este era um filme cuja premissa trazia o suspense consigo, o resultado fica bem distante disso. A premissa provavelmente afundou junto com o bom senso das personagens principais, ou foi morta pelo caráter duvidoso do antagonista. Vai saber.

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