Não existe tempo para amar. Essa é a mensagem mais forte deste belo e delicado “Suk Suk – Um Amor Em Segredo”. Aqui, a história de dois homens maduros é contada através de uma ótica sensível, ainda que muitas vezes brutal com seus personagens, os quais são apresentados como seres humanos comuns, ordinários no sentido literal, que têm vidas com erros e acertos e, sobretudo, memórias a serem contadas. Assim, o que poderia soar como algo brega, acaba dilacerando o coração do espectador pela perspicácia com a qual é contada, sem jamais subjugar seus personagens – e nem quem os assiste.
Pak (Tai Bo) é um motorista de táxi que vive sua vida de forma rotineira, enquanto sua esposa cuida de casa, frustrada com as contas sempre apertadas, torcendo para que a filha se case com um homem rico, e não que cometa o mesmo erro que ela: seguir o sentimento ao invés da lógica de encontrar um parceiro abastado. Porém, o que mais parece incomodar Pak é o fato de ele se sentir sozinho, em casa ou na rua, justamente por não se encontrar mais nos mesmos ambientes de sempre de maneira confortável – ainda que sinta grande orgulho da família que criou, e da forma com a qual conseguiu equilibrar as finanças, mesmo que não tenham sido altas o suficiente para excessos de conforto.
Por sua vez, Hoi (Ben Yuen) é um pai solteiro e aposentado, cujo filho o enxerga como alguém que está prestes a não saber mais cuidar de si mesmo, ainda que jamais considere realmente a ideia de colocar o pai em um asilo. Porém, Hoi percebe as intenções do filho, e há muito decidiu apenas aproveitar a companhia dele, de sua esposa e de seu pequeno neto, e o faz de forma quase submissa, ainda que seja dono de seu próprio nariz e da casa na qual está.
Porém, o que une Pak e Hoi não é o fato de ambos serem homens maduros com famílias criadas e as pequenas frustrações do dia a dia, e sim o fato de serem homossexuais em um país conservador que não enxerga com bons olhos os jovens gays, quiçá os maduros e com famílias inteiras. Como o preconceito está sempre à espreita, e o filme faz questão de mostrar, ambos se encontram em um acaso da vida e, desde então, passam a cultivar uma relação às escondidas. Porém, como se veem em uma casa de banho, na qual se encontram outras pessoas com a mesma finalidade, o longa faz questão de apresentá-los como uma comunidade, pois, no mesmo local, apesar da intenção sexual, há encontros para simples conversas ou jogos de baralho.
Assim, o diretor Ray Yeung é hábil em criar uma atmosfera cotidiana, que passa a acompanhar a vida de seus personagens principais quase que ao acaso, como se ambos pudessem de fato serem encontrados na rua. Aliás, o roteiro, também de Yeung, faz questão de mostrar aqueles personagens de maneira orgânica, e tanto Tai Bo quanto Ben Yuen são mestres em encarnar o homem comum, sujeitos às adversidades de suas famílias, mas temerosos em mostrar ao mundo quem realmente são. Além disso, os atores não encontram nenhum tabu na composição dos corpos de seus personagens, e isso transmite a transparência com a qual o roteiro foi construído.
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Para complementar a atmosfera aqui apresentada, a fotografia de Ming-Kai Leung torna a cidade em algo quase genérico, em uma composição de prédios dentro dos quais estão os verdadeiros segredos e, ao mesmo tempo, as vidas, que correm como sangue naquelas veias repletas de vontades e desejos tolhidos pela sociedade. Por sua vez, o trabalho de Albert Poon no desenho de produção é formidável ao jamais tirar o protagonismo daqueles personagens, ainda que as cores de objetos e prédios e ruas e até mesmo do mar sejam quase as mesmas – existe uma visão que beira o monocromático como representação da monotonia daqueles personagens, e da ausência de outras tonalidades como consequência de suas vidas e idades avançadas.
Porém, por mais melancólica que seja a composição completa de “Suk Suk – Um Amor em Segredo”, existe uma doçura delicada que está presente o tempo inteiro na história, mesmo que esta seja apenas um recorte de algumas vidas, quase uma crônica escolhida aleatoriamente. Desta forma, o trabalho do diretor é excepcional porque ele funciona como um retrato daqueles homens, da sociedade como um todo ao enxergar os mais velhos como seres sem direito à plena existência, e de um país (Taiwan) que apaga a diversidade em pleno século XXI. Aqui está a força de um cinema que tem muito a falar, mesmo com personagens tão silenciosos quanto Pak e Hoi.
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