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Rainer Werner Fassbinder (Oliver Masucci) foi um dos diretores mais autênticos da história do cinema, além de prolífero a ponto de ter acumulado mais obras do que anos de vida. Ele faleceu com apenas 37 anos, e seu legado é estudado por gerações e gerações desde os anos 1980, a fim de compreender as diversas nuances de seus olhares cinematográficos, enquanto as polêmicas no entorno de sua personalidade ditavam as regras fora das câmeras. Assim, um pouco disso tudo é retratado neste “Fassbinder: Ascensão e Queda de Um Gênio”.

A partir do ponto de vista do próprio diretor, o espectador vai acompanhá-lo em seus diversos experimentos audiovisuais. De diretor, roteirista, produtor, compositor e até mesmo ator, o artista em questão é retratado como o protagonista inegável desta obra e de sua vida, algo que fez questão de deixar claro a todos ao redor, através de uma personalidade indomável, muitas vezes irascível, cujas palavras em sua maioria eram proferidas como facas aos seus interlocutores. Desta forma, a visão deste filme escapa do retrato comum de uma cinebiografia, que engrandece seus protagonistas, mas tampouco o diminui. O objetivo aqui é apresentar o cineasta como ele foi.

Por isso, desde os primeiros minutos de filme o espectador provavelmente mergulhará em uma verve incômoda e masturbatória, cuja escolha do diretor, Oskar Roehler, é proposital para tornar esta experiência tão peculiar quanto seu homenageado. Assim, será comum vivenciar a vida amorosa de Fassbinder junto dele, e mergulhar em seus momentos de libertinagem sexual, uso de drogas e tudo o que parece manter sua personalidade levemente entorpecida. Quando não, sua fúria é grande o suficiente para torná-lo odiável, e suas atitudes são misóginas, homofóbicas e anárquicas de todos os pontos de vista sociais e profissionais.

Desta forma, o filme carrega de forma pesada a trajetória meteórica de alguém que amava o audiovisual, e experimentava cinema e televisão, produzindo em ritmo acelerado como se soubesse, como tantos outros gênios intensos e inconsequentes, que sua passagem por esta vida seria breve. E foi. E Fassbinder se relacionava com o trabalho com a mesma intensidade com que buscava relacionar-se com outros homens, raramente deixando-se cair em emotividade. Com o passar do filme, durante o longo e cansativo segundo ato, é provável que o espectador sinta-se incomodado com a fidelidade escolhida por Roehler, mas, acredite, isso faz parte da experiência.

Enquanto Oliver Masucci brilha em sua composição, com todos os trejeitos e verossimilhança física junto de seu personagem, o espectador mergulhará em uma experimental composição metalinguística na qual a maquiagem (Schwerthelm Ziehfreund) e o figurino (Peri de Bragança) são apenas peças de um olhar quase teatral para a vida e obra do cineasta. Por isso, o desenho de produção escolhe cenários abertos, enquanto Oskar Roehler (sim, o diretor) opta pelo “menos é mais”, dando espaço à direção de arte de Markus Schütz, o qual deixa apenas os elementos fundamentais à cena, algo visto na filmografia de Fassbinder, e que também é levado ao cinema por Lars Von Trier (vide “Dogville”).

Dotado como um dos precursores do cinema novo alemão, há diversas características do que Fassbinder criou, claramente inspirado na Nouvelle Vague, aqui Roehler brinca com a realidade trazendo a subjetividade de seu protagonista. Desta forma, há uma mistura de cores contrastantes, algo que, no preto e branco, se assemelharia também ao expressionismo alemão, mas que aqui quis retratar as cores de forte apelo sensual e violento as quais o cineasta estava testando em sua filmografia. 

Porém, apesar de servir como um bom estudo de personagem, e uma introdução à vida daquele artista, este “Fassbinder: Ascensão e Queda de Um Gênio” apresenta uma convencionalidade rítmica que beira o marasmo, e isso atrapalha em parte a experiência porque, além de deixar diversas nuances de fora, e focar em aspectos não tão interessantes, o filme também conta com o vagaroso segundo ato, e causa sistematicamente o desinteresse de quem estava, até então, compactuando com esse olhar. Ainda que incompleta, é uma experiência recomendável.

O post Crítica | Fassbinder – Ascensão e Queda de Um Gênio (2020): experimental e modesto apareceu primeiro em Cinema com Rapadura.

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